Ana Procópio

Por GN em

Ana Procópio. Foto cedida por Basilissa Lima

Ana José Rodrigues

São Lourenço, Fogo, 1866 – São Filipe, Fogo, 1957

Compositora de rafodju, cantadeira

Ana Procópio foi uma cantadeira célebre da ilha do Fogo. Interpretava as cantigas da sua própria autoria, improvisando. Grande parte do que se sabe da sua produção deve-se ao investigador Félix Monteiro, que recolheu diretamente da autora, pouco antes da sua morte, trechos de cantigas e alguns versos isolados, que falam de amor, prazer e ciúme, de aspetos da realidade da época, exaltam ou criticam personagens locais.

“Era uma velhinha simpática, pequenina, alegre, com uns olhinhos espertos, a cara amorenada sempre iluminada por um sorriso gaiato, denunciador do seu conhecido bom humor permanente”, escreveu Monteiro na revista Claridade (dezembro de 1960). “Analfabeta, admirava-se do interesse manifestado por certas pessoas letradas pelas coisas que noutros tempos cantava mais ou menos à toa, sem tempo para pensar nas consequências. Consequências desagradáveis muitas vezes – confidenciou – quando o improviso descambava em verdadeira curcutiçã, com remoques e chalaças inconvenientes, a que no Fogo se dá o nome de rafojo.

De língua afiada, Ana Procópio improvisava com acompanhamento de violão, cavaquinho, viola e violino, formação habitual dos grupos da época, que eram convidados para animar festas. Estas festas ocorriam, por exemplo, quando regressava à ilha um dos muitos emigrantes enriquecidos nos Estados Unidos, que vinham com os bolsos cheios de dólares e a alma ansiosa por confraternizar – e tudo terminava em baile.

Tocador

Ha’l tem mon ligêro

Cantadêra

Ha’l tem lingua ‘sperto

Ana Procópio, recolha de Félix Monteiro, em “Claridade”

Inspirado na sua irreverência, o escritor francês Jean-Yves Loude, que realizara pesquisas etnográficas em Cabo Verde, fascinado com o que ouvira contar sobre Ana Procópio, escreveu o romance Ana Désir, publicado em França (Éditions La Passe du Vent, 1999). O livro não tem carácter biográfico, mas é inspirado na imagem de força que ela deixou. Por sua vez, Luís Pires, um dos dinamizadores do grupo teatral Canisadi, que existiu entre 1998 e 2001 em São Filipe, adaptou para o teatro trechos de Ana Procópio.

Ana Procópio. Fonte: www.barrosbrito.com

O cantor e compositor Talulu gravou no seu CD Braga Maria (2002) um tema que é a adaptação (por Talulu e Lívio Lopes) da melodia tradicional do brial (música das festas de bandeira da ilha do Fogo) com versos de Ana Procópio.

Ana Procópio é avó do antigo primeiro-ministro e presidente da República de Cabo Verde Pedro Pires.

Em 1987, foi inaugurada na localidade de Campanas, na ilha do Fogo, uma escola com o nome de Ana Procópio. Na atualidade, nesta mesma localidade, o Grupo Cultural Ana Procópio, que assumiu este nome para homenageá-la pelo seu papel na cultura local, procura manter vivas tradições culturais como o paravante.

Para saber mais

  • “Cantigas de Ana Procópio”, Félix Monteiro, revista Claridade, nº 9, Dez. 1960.
  • “Cantar muita gente canta, mas cantadeira… Era Ana Procópio”, Sabino Galvão Batista, revista Magma, nº 1, abril 1988.
  • Artiletra, nº 54, 2003, vários textos, entre os quais a reprodução dos dois citados acima.

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