Orlando Pantera 

Por GN em

Orlando Pantera.
Arquivo Paralelo 14

Orlando Monteiro Barreto

Santa Cruz, Santiago, 1967 – Praia, Santiago, 2001

Compositor, Instrumentista (violão) 

Orlando Pantera, cuja curta carreira foi suficiente para dar nome a uma espécie de movimento musical ocorrido na virada para o século XXI, aquele realizado pela chamada “geração Pantera”, deixou como marca para a música cabo-verdiana – embora sem ser o único a fazer isso – a transposição, para o violão, do ritmo da percussão efetuada tradicionalmente pelos grupos de batuku, música e dança tradicionais do interior de Santiago.

Ao mesmo tempo, compôs letras que versam sobre esse universo rural ou semi-rural, aspetos do quotidiano dos santiaguenses, hábitos, formas de relacionamento, etc.

Nascido no interior de Santiago, Orlando Pantera, segundo um site que lhe é dedicado, www.opantera.com, criado por Mic Dax, migrou com a sua família para Angola tendo regressado a Cabo Verde com cerca de 10 anos. Antes de começar a se tornar uma celebridade, no início dos anos 1990 ensinava música na escola Pentagrama e no Centro Juvenil de Assomada (município de Santa Catarina, interior de Santiago). A certa altura, foi o coordenador artístico da Aldeia Infantil SOS dessa cidade.

Integrou em meados da década, como baixista, o grupo Pentágono, que gravou no seu único disco, lançado em 1994, algumas músicas suas, e tocou baixo também no quinteto Capeverdeans Jazz Band. Neste efémero grupo, o contacto com músicos como Djinho Barbosa e Ney di Belinha (Ney Bettencourt) terá grande influência no seu percurso, abrindo-lhe os horizontes musicais. A este propósito, Barbosa defende que Bettencourt, “estudioso da guitarra, amante do jazz e da música inteligente”, terá sido “como que uma central elétrica para Orlando Pantera”. Nessa época, Pantera passou um período no Brasil, onde, em Salvador (Bahia), frequentou formações de percussão com grupos como Muzenza, Ilê Ayé e Olodum.

“A pesquisa que faço reproduz o que eu vejo, não só o que eu ouço; reproduz aquela pessoa, homem ou mulher, que chora, que está com o pé no chão, que salta de alegria, então tenho que tirar o seu olhar, sua boca, seu cabelo, sua raiva, igual àquele homem do interior de Santiago, pois estou a falar dele, estou a imitá-lo; então procuro ir o mais longe que posso em reproduzir o que vejo, o que ouço e o que sinto.”

Orlando Pantera, em entrevista (?), s.d.

No início da década de 1990 o grupo Os Tubarões gravou, no seu último álbum, três temas da autoria de Orlando Pantera que foram sucesso e projetaram o seu nome como compositor. Mas antes disso já o cantor Mário Rui tinha gravado um disco com vários temas seus. Foi, aliás, a primeira gravação da morna “Seiva” (ou “Regasu”), que veio a ter mais tarde várias outras interpretações. Zouks e kolazouks são outros géneros que se inscrevem na produção daquele que viria a se tornar um ícone do batuku contemporâneo.

Em 1998, Pantera colaborou com a coreógrafa portuguesa Clara Andermat em Uma história da dúvida, aparecendo na ficha técnica entre os músicos, colaboradores e performers, como assistente de direção musical, além de ser autor da música original – “Batuko” e “I am a professional” (esta última em parceria com João Lucas). Em 1999, a mesma companhia estreou o espetáculo Dan dau, em que Pantera colaborou na criação e em que aparecem duas músicas da sua autoria: “Ciré” e “Batuko”. Neste mesmo ano, integrado no grupo de dança cabo-verdiano Raiz di Polon, o seu nome aparece em Pêtu e em 2000 em CV Matrix 25 (ambas as peças da autoria e com coreografia de Mano Preto), assinando a direção musical. Está também entre os intérpretes e cocriadores das bandas sonoras, tendo criado a maior parte das músicas para as duas peças. Dan dau terá a sua banda sonora editada em CD em 2001. Na voz de Pantera, aparecem nesse disco os temas “Ciré” e “Batuko”, assim como “I am a professional” (da peça Uma história da dúvida).

O grupo Arkora foi outro projeto em que Pantera esteve envolvido nessa época e a interação com os seus membros, que tinham uma perspectiva jazzy, terá contribuído para que crescesse como músico e compositor, passando a criar harmonias mais complexas.

Em novembro de 2000, o músico foi o vencedor do prémio Revelação do festival Sete Sóis Sete Luas, realizado na vila da Ribeira Grande (Santo Antão). Era com o dinheiro desse prémio que Pantera iria gravar o seu primeiro trabalho discográfico, e preparava-se para viajar para o estrangeiro quando, na Quarta-Feira de Cinzas de 2001, foi internado no hospital da Praia com uma pancreatite aguda, falecendo horas depois.

Após a sua morte, começam a circular cópias piratas de temas gravados por ele, aparentemente numa atuação ao vivo, intercalados com trechos de uma entrevista possivelmente a uma emissora de rádio, gravada entre finais de 2000 e início de 2001 (pois a dada altura ele diz prever gravar em fevereiro, e era nos primeiros dias de março desse ano que tinha viagem marcada para esse efeito). Entre esses temas encontram-se “Lapido na bo”, “Vasulina”, “Sukundida”, “Dispidida”, “Raboita de Rubon Manel”, “Batuko”, “Ciré”, que irão aparecer mais tarde, quase todas, em discos de Lura ou Mayra Andrade.

Na altura da sua morte, Pantera colaborava com o realizador guineense Flora Gomes, que filmava em São Vicente a longa-metragem Nha fala. Era previsto que o artista compusesse a música original desse filme, tarefa que acabou sendo entregue ao camaronês Manu Dibango.

Dois anos depois, o cantor Djudja lançou o disco Nu ta prova, no qual, a título de homenagem, aparece o tema “Padaz d’mi”, que começa por um sample da voz de Pantera. A viúva não esteve de acordo e o disco foi retirado do mercado. O grupo de rap Bairro Side, por sua vez, gravou, também com um sample da voz do cantor no início, o tema “Papia ku mi”, que não se encontra em disco mas foi veiculado pela Internet.

O documentário Mais Alma, de 2001, da realizadora portuguesa Catarina Alves Costa, mostra aspectos da produção musical de Pantera.

Em 2021, quando se completarm 20 anos da morte do músico, a sua filha, Darlene Barreto lançou o projeto de criação da Fundação Orlando Pantera, tendo entre os seus objetivos fazer recolhas do legado do artista, em que se inserem as suas composições mas também o trabalho social que realizou. Segundo a fundação, a partir de uma ideia de Darlene, a Companhia Clara Andermatt irá estrear em 2022 a peça Pantera, criação de Clara Andermatt e João Lucas e que terá a participação especial de Mayra Andrade.

Composições

Alegria; Batuku; Berçu purga; Bida n gostadu; Dispidida; Dos mano; I am a professional; Ka Fila; Ka tem giganti; Kurason Negru (poema de Dany Spinola musicado por Pantera); Lapido na Bo; Linda; Mandela; Mulata; Narina; Nhinha; Nuná; Ora bom dia; Primeru beju; Rabidanti; Raboita di Rubon Manel; Regasu (Seiva); Roda dos alimentos; Sereia; Serenata; Sire; Speransa; Sukundida; Tabanka; Tunuka; Vasina; Vasulina (penti di ferru kenti); Xuveru d’Iluzon; Zouk express.

Para saber mais

Mais Alma, documentario de Catarina Alves Costa (2001), Portugal, Larana azul, 57 min.

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