Banda Municipal da Praia

Por D O em

Banda Municipal da Praia, na praça Alexandre Albuquerque, 2021. Foto: Inforpress

Banda filarmónica, início séc. XX

Em vários momentos, no início do século XX, encontramos na imprensa cabo-verdiana referências à Banda Municipal da cidade da Praia. Por exemplo, em março de 1911, o jornal A Voz de Cabo Verde (29.03.1911) informa que a banda, depois de um intervalo de duas semanas, apareceu novamente ao público com um novo mestre, o Sr. Guimarães. Este regente permanece no posto até meados de 1913, sendo esse período marcado por algumas polémicas, tendo como pano de fundo a mudança política ocorrida em 1910, com o início da era republicana, e ainda a sua má vontade em tocar a morna, que dizia não ser música por não vir no dicionário, facto pelo qual foi duramente criticado pelos dois jornais existentes na época: A Voz… e o Futuro de Cabo Verde.

A 25.11.1911, A Voz… refere a intenção do governo da metrópole de acabar com as bandas de música nas colónias, por razões de economia. O jornal reage vivamente, defendendo a permanência das poucas oportunidades de diversão que elas proporcionam, e afirma que seria possível economizar muito mais se fossem substituídos por civis os militares metropolitanos que ocupavam cargos administrativos nas colónias. Na mesma página fica-se a saber que a banda em questão é militar e que toca duas vezes por semana. Um abaixo-assinado contra o decreto que acabaria com as bandas corre na Praia e é enviado a Lisboa. Em Agosto de 1912, a banda é extinta e transformada em Banda Municipal da Praia, embora subsidiada pelo Estado. Mas a sua situação não parece ser das melhores nos tempos que se seguem, segundo dados que a imprensa da época revela, como a falta de compromisso dos músicos, a ausência de fardas condignas, entre outros aspetos.

Com a saída de Guimarães, entra em cena Valentim Lopes Tavares, Pipi, que terá permanecido como regente até por volta de 1927, pois no final desse ano, como revela uma nota do Diário de Notícias, de New Bedford (06.12.1927), foi enviado da metrópole um  novo regente, Carlos Pinto, contratado para a Banda Municipal da Praia. Em 1930 Henrique de Pipi, filho de Valentim Lopes Tavares, assumiu a banda, que dirigiu até falecer, aos 32 anos, em 1935. Também sob a coordenação deste último a banda esteve em crise, por razões orçamentais, e em 1933 houve uma ameaça de extinção que, contudo, não se confirmou.

Armando de Lima Pereira, colaborador do jornal O Eco de Cabo Verde, assina nessa época várias crónicas a falar das noites com música no coreto na Praça Alexandre Albuquerque. Uma delas, a 22.12.1934, traz uma descrição minuciosa das relações sociais da época, com a praça dividida em dois setores: o do “pé descalço” e o do “pé calçado”. Os habitantes do segundo setor, escreve Pereira, “podem introduzir-se no primeiro, mas os do setor primeiro não podem invadir o segundo sem correr o risco de serem corridos a toque de caixa”.

Cesário e Manuel Clarinete. Foto cedida por Cesário Duarte.

A partir de 1946 e durante 21 anos, Jorge Monteiro foi o regente da Banda Municipal da Praia. Cesário Duarte e Manuel Clarinete, que chegaram à capital no início da década de 1950, provenientes do Mindelo, foram logo recrutados. Com o regresso de Jorge Monteiro a S. Vicente, em 1967, a banda ficou sob a coordenação do contramestre Eugénio Varela, em 1971 substituído pelo militar português Joaquim Galeno Safara, que fica até 1973. É então que Manuel Clarinete assume a banda como regente, e também no seu tempo houve crises. Uma delas ocorreu em meados da década de 1970, chegando as atividades a ficarem interrompidas até formarem-se novos músicos, no início da década de 1980. A outra foi em 2004, por falta de condições materiais para as atuações no coreto.

Entre os músicos que se destacaram em outras áreas musicais à parte as bandas e que fizeram a sua iniciação musical com Manuel Clarinete contam-se Totinho, Nhela Sax e  Iduíno (Ferro Gaita), entre outros.

E os irmãos Juvenal Moreno Tavares, Casimiro Moreno Tavares e Roberto Moreno Tavares. Todos tornaram-se regentes. O primeiro, da Banda Municipal da Praia, após a morte do mestre, e o segundo da banda das Forças Armadas, para a qual foi contratada a partir de certa altura uma parte dos músicos da Banda Municipal. Casimiro, depois de ter sido durante anos regente da Banda das Forças Armadas, deixou a batuta com o seu irmão mais novo, Roberto, desde então regente da banda militar. E esteve ligado também à criação da Banda Municipal de São Domingos, na formação dos músicos que vieram a constituí-la, em meados da década de 2000.

Como antecedentes, recuando ao século XIX podemos encontrar, segundo A Imprensa Cabo-verdiana 1820-1975 (da autoria de João Nobre de Oliveira, 1998) várias formações que antecedem a Banda Municipal da Praia: Sociedade Filarmónica Juventude, fundada em 1864; Sociedade Euterpe (alusiva à deusa da música e da poesia lírica da mitologia grega), que aparece em 1876; Sociedade Recreativa Praiense, fundada em 1892. Por sua vez, a Revista de Cabo Verde (1899), dá conta em mais de uma edição da existência de uma “Banda dos Bombeiros das Obras Públicas”. Refira-se também, na Praia, em meados da década de 1920, a Banda de Música da Polícia Indígena.

Para saber mais

Notícias que Fazem a História. A Música de Cabo Verde pela Imprensa ao Longo do Século XX.  Gláucia Nogueira (ed. da autora, Praia, 2007). 


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Agradecimentos a Joaquim Saial e a João Semedo pelo apoio na produção do conteúdo desta página.

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