Raul de Pina, Nho

Por D O em

Nho Raul de Pina, durante o Fesquintal de Jazz, Praia, 2002. Foto: Olav Aalberg

Raul Cova de Pina

Nova Sintra, Brava, 1902 – Nova Sintra, Brava, 2005

Compositor, cantor, instrumentista (cordas)

A primeira notícia que se encontrou a referir o nome de Nho Raul de Pina é de 1934, quando um artigo n’O Eco de Cabo Verde (21.11.1934) refere a morna, já nessa altura célebre, “Nossa Senhora do Monte”, cuja melodia é da sua autoria (a letra, de António José da Rosa). Esta foi uma das mornas interpretadas por Luís Rendall e seu grupo na Exposição Colonial do Porto, em 1934. Gravada por vários artistas, em alguns discos, contudo, aparece sem o crédito a Nho Raul de Pina. Ele próprio irá gravá-la no seu disco Maday (2000). O artigo de O Eco de Cabo Verde refere ainda que Raul de Pina “toca e canta ao mesmo tempo; com a voz máscula dum barítono perfeito”.

Ao longo da sua vida que atravessou todo o século XX e o ultrapassou, Nho Raul de Pina foi testemunha e personagem ativo de diferentes momentos da música cabo-verdiana. Desde a infância conviveu com Eugénio Tavares, tendo sido o divulgador das mornas do poeta, que, assim que ficavam prontas, mandava chamá-lo para as aprender e tocar. Na Praia, onde viveu 35 anos, conviveu com o poeta Jorge Barbosa, que lhe teria proposto comporem música em parceria, mas o acaso ou o destino não deixou, pois nessa altura Barbosa foi para Portugal e Pina regressou à sua ilha, como refere o Voz di Povo (22.07.1987).

A certa altura, foi convidado a animar as festas de São João e São Pedro na ilha do Fogo e, depois de tocar durante 13 noites seguidas, acabou ficando por cinco anos naquela ilha, relatou ao A Semana (12.04.2002) por ocasião do seu centenário.

Foi aos 98 anos, já na era das gravações em equipamento digital, que gravou o seu único álbum, Maday, mas numa obra de recolha de música tradicional cabo-verdiana editada em França no início dos anos 1990, Iles du Cap-Vert – Les racines, produzida por Manuel Gomes, aparecem a voz, o violino e a viola tocados por Nho Raul, que embora tenha ficado conhecido sobretudo como violinista, dominava os instrumentos de corda de modo geral.

Em 1998, nas suas pesquisas pelo arquipélago, o antropólogo e escritor francês Jean-Yves Loude gravou-o a tocar e a cantar, no âmbito das recolhas que resultaram no CD duplo Cap-Vert un Archipel de Musiques, mas os seus trechos acabaram por não entrar no disco editado em França. Os originais, contudo, encontram-se sob a responsabilidade do Arquivo Nacional de Cabo Verde, embora sem a possibilidade de consulta até hoje. Na Brava, Loude foi levado à casa de Nho Raul, depois de ter receado incomodá-lo, devido à idade. “Mas estávamos enganados. Raul de Pina, direito no limiar da porta, de fato azul-marinho, camisa às flores e chapéu branco, declina a sua idade como uma garantia de seriedade”, lê-se em Cabo Verde – Notas Atlânticas (1999).

Na década de 1990, Nho Raul atuou na Expo Sevilha, em 1992, e no festival Smithsonian, nos EUA, em 1995, nesse ano dedicado a Cabo Verde.

Nho Raul de Pina e grupo. Ilha Brava. Fonte: Arquivo Nacional de Cabo Verde

Para além de músico, foi um hábil artesão – ainda criança, fabricou com uma lata o seu primeiro instrumento – e criava peças com carapaça de tartaruga. Quanto a composições suas, além da célebre “Nossa Senhora do Monte”, referiu em entrevista ao Novo Jornal de Cabo Verde (20.09.1995) ter muitas, mas não se lembrar delas, mencionando contudo os títulos de “Praia d’Aguada” e “Mar de Fajã d’Água”.

Em 2021, o presidente da República Jorge Carlos Fonseca condecorou Nho Raul de Pina a título póstumo com a 1ª Classe da Medalha do Vulcão.

Discografia

  • Maday, CD, NT&T, New Bedford, 2000.
  • Iles du Cap-Vert – Les racines, Sunset, Paris, 1990.  

Composições

Mar de Fajã d’Agua; Nossa Sra. do Monte (parceria com António José da Rosa); Praia d’Aguada (parceria com Augusto Casimiro); Partida (parceria com Fuca).

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